Esta entrevista foi realizada como parte do projeto Escuta, evento de audição presencial de álbuns de canção popular brasileira contemporânea, intercalada com a entrevista de seus respectivos artistas criadores. O Escuta aconteceu na Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro, entre 2016 e 2019, organizado pelo Núcleo da Canção do Laboratório da Palavra (PACC-UFRJ). Nesse intervalo, foram feitas 17 entrevistas, cada qual sobre um relevante disco da produção contemporânea. A partir de agora, a Revista Polivox começa a disponibilizar esse rico acervo, que permite compor um interessante panorama sobre a canção popular no Brasil dos últimos anos. A primeira entrevista que agora vem a público é, em verdade, a segunda do projeto, datada de 04 de novembro de 2016, com Júlia Shimura e Pedrinhu Junqueira, que haviam lançado naquele ano o disco “Haicu”, que também deu nome ao duo. Quem quiser fazer a experiência completa, pode ouvir as canções indicadas, enquanto faz a leitura da conversa, tal como fizemos à época.

Produção: Bruno Cosentino e Rafael Julião
Roteiro: Isabela Bosi e Rafael Julião
Transcrição: André Nascimento Santos Filho
Edição: Rafael Julião
Rafael Julião – Boa tarde! O projeto Escuta começou no mês passado, com o Luís Capucho, e a ideia da gente é aproximar ainda mais a faculdade de Letras, que já fez uma aproximação com a tradição da canção popular brasileira, mas ainda pode fazer uma aproximação maior com a canção popular contemporânea. Então, nossa intenção é trazer artistas da canção contemporânea, para que a gente ouça seus respectivos discos, e converse sobre os processos de composição, sobre o projeto do disco, e conheça mais os artistas, as obras.
Isabela Bosi – É… o Escuta acontece sempre na primeira semana do mês, a gente recebe os músicos na sala do PACC (Programa Avançado de Cultura Contemporânea) e vai ouvindo o disco, conversando. É uma conversa aberta, pode vir quem quiser, participar, perguntar e assistir, e essa é a segunda edição do Escuta, a gente tem o Pedrinhu Junqueira e a Júlia Shimura, que lançaram no ano passado o disco Haicu, e a gente vai perguntando e parando no meio das perguntas pra ouvir as canções e conversando. Vamos começar perguntando sobre como foi a relação de vocês com a música, como começaram a fazer música? E como vocês começaram a fazer música juntos, como se encontraram?
Pedrinhu Junqueira – Eu comecei a fazer música bem cedo, com uns 10,11 anos… Era uma coisa muito informal. Minha mãe tocava violão e ela me ensinou os primeiros acordes, aquela coisa, e eu nunca fui muito bom de tirar música dos outros, sempre tive essa onda de começar uma historinha e fazer uma palavra, e as coisas tomaram um rumo engraçado, vim fazer faculdade de Letras, pensando nisso, em 2005, tinha uns 18, 19. Mas era algo que vinha de forma espontânea, nunca parei e pensei : “Ah, eu vou me tornar compositor, vou ser músico”, foi algo que foi rolando e o feedback das pessoas me incentivou a continuar, não foi nada planejado. Venho de uma família de médicos, então foi difícil pra caralho me assumir como compositor e seguir mesmo, porque a vida de artista é uma vida bem difícil, ainda é complicado, mas surgiu de uma forma espontânea, me apaixonei pelo violão. A memória que eu mais tenho sobre isso é que eu repeti a sétima série, fui expulso do colégio, porque eu estava completamente obcecado em tocar violão.
Rafael Julião – Tocar o quê? Quais as primeiras coisas que você ouvia e que te chamavam a atenção?
Pedrinhu Junqueira – Cara, as primeiras coisas que eu ouvia eram o que a minha mãe escutava muito, era Clube da Esquina, Gil e Caetano, coisas bem populares… Bob Dylan, Beatles e outras coisas, minha mãe adora música brega, Lulu Santos, eu tocava de tudo. Quando eu fiz uns 15, 16 anos, eu entrei pro samba e fiquei apaixonado pelo Cartola, e fui atrás de outros sonhos. Depois veio a parte do teatro, que fazendo faculdade de Letras, eu fiz um projeto de musicar poemas, e fizemos algumas viagens com a UFRJ. Nisso conheci a galera de direção teatral e me apaixonei por teatro, hoje vivo disso, de música pra teatro e foi em uma dessas que eu conheci a Júlia. Seria legal até você [olhando pra Júlia] falar como você começou a compor e tal.
Júlia Shimura – Eu lembro que eu fiz uma viagem com uma amiga, que levou um violão e começou a me ensinar uns primeiros acordes, aí comprei um violão, comecei a aprender sozinha, nunca fiz aula, tudo que eu aprendi foi com revistinha de cifras, na época nem tinha internet. Mas eu, na verdade, nunca tive grandes piras com o violão, de instrumentista, acho que eu sempre toquei mais pra me acompanhar cantando. Agora a questão da criação foi uma coisa muito presente na minha vida, me lembro de ser uma criança muito inquieta e eu sempre tinha que inventar alguma coisa, fosse uma pulseirinha, pintar algo, sempre tive isso. Então, acho que foi algo natural, eu começar a tocar violão e, eu já escrevia e tal, sempre tive uma pira com isso, e naturalmente fui criando minhas coisas e cada vez mais o violão foi servindo a isso, cada vez menos eu fui aprendendo música dos outros e mais pirando nas minhas questões e tal, e eu sempre fui bem envergonhada pra mostrar as minhas composições. Aí fui fazer faculdade, fiz comunicação, ia fazer cinema, mas fiquei com medo e acabei fazendo publicidade, no final da faculdade já tava pegando umas matérias de cinema, que eram de interpretação, já fazia teatro desde criança e aí chutei o balde e fui fazer Martins Pena, junto com isso tive aula de canto e a composição sempre esteve próxima, não como o Pedrinhu, que sempre mostrava suas músicas novas e tal. Nos conhecemos no teatro, fazendo uma peça e aí ficamos anos sendo muito amigos, até que um belo dia a gente não foi só amigos…
Pedrinhu Junqueira – Foi algo de um dia pro outro, fomos morar juntos no outro dia…
Júlia Shimura – Aí a gente nem namorou, nos casamos dentro de um mês, ele já não estava mais indo pra casa, tinha cachorra, que ele já tava deixando meio que abandonada, e quando viu a gente tava morando, e foi acontecendo naturalmente , tanto eu mostrar minhas músicas quanto a fazer coisas juntos.
Pedrinhu Junqueira – A Júlia tem uma complexidade harmônica muito impressionante, e acho isso muito maneiro. Eu lembro de uma das primeiras músicas que você mostrou pra mim e um amigo meu, Pedro Dantas, e a gente ficou impressionado, as harmonias bonitas…
Júlia Shimura – Em níveis diferentes também, eu e o Pedrinhu não temos um nível formal de música, mas temos um lugar muito intuitivo na hora de compor.
Pedrinhu Junqueira – Eu sempre trabalhei com intuição, até tentei estudar música na minha vida, mas nunca consegui fazer um curso pra passar na UNIRIO, não conseguia fazer solfejo. Pra mim a música sempre foi uma válvula de escape.
Júlia Shimura – Tive algumas tentativas, fiz Villa-Lobos durante pouco tempo, fiz sistemas durante pouco tempo, aí tem uma hora que você fala: “tem um cara ali que vai me ajudar, ele rearmoniza, faz outra coisa”.
Pedrinhu Junqueira – Fui aprendendo muito com meus amigos músicos também, e isso foi o que mais me motivou nos últimos 10 anos, e receber elogios deles, eu que nunca estudei música formalmente, é incrível.
Isabela Bosi – É uma confirmação né?
Pedrinhu Junqueira – É, eu sempre fui guiado por isso, as coisas vão acontecendo de uma maneira não planejada e orgânica, e o Haicu existiu muito nisso. Nós estávamos morando juntos, começamos a compor, aí a gente fez uma peça, e aí começamos a fazer um disco.
Rafael Julião – Vocês escolheram o nome do disco primeiro ou o nome da dupla?
Pedrinhu Junqueira – O disco.
Rafael Julião – Queria que vocês comentassem também o nome Haicu que é um nome que soa estranho no começo, e depois fui descobrir que tem a ver com haicai, que são formas poéticas japonesas, e o próprio “Leve” é uma composição muito próxima ao haicai. Queria que vocês comentassem sobre essa ordem e essa escolha de “Haicu”?
Pedrinhu Junqueira – Eu lembro de algumas pessoas comentarem: “nossa como você tem umas músicas curtas”.
Júlia Shimura – As pessoas falavam: “aí, nossa, o Pedrinhu faz uns haicais.”
Pedrinhu Junqueira – Porque até então a gente não sabia, que só no Brasil se fala “haicai”, justamente por causa do “cu”. Foi uma revolução ortográfica de 1940 que o pessoal do Brasil mudou pra “haicai”.
Rafael Julião – A estrutura da palavra haicai, pelo que já li, tem duas partes, uma que tem a ver com gracejo e a outra com harmonização, realização, e junto fazem o haiku, que seria esses poemas curtinhos de três versos, com 5-7-5 sílabas poéticas, no geral. Uma forma medida e muito agoral, em relação à natureza, de uma sabedoria do olhar. Mas é uma composição fixa, e vocês se aproximaram dela intuitivamente, pelo que entendi.
Pedrinhu Junqueira – Acho que foi uma questão semântica, que os haicais tem aquela coisa da contemplação, da passagem do tempo, que, intuitivamente, tá no processo criativo meu e da Júlia. E aí chegamos nesse conceito. A Júlia tem uma bagagem japonesa, o pai dela é japonês, o que foi algo novo pra mim.
Júlia Shimura – Foi difícil gravar o disco, o Pedrinhu tem diversas músicas.
Isabela Bosi – Como foi essa escolha das composições?
Júlia Shimura – Eu não me lembro como que surgiu essa coisa do Haicai, e achei que era um “link” que tinha a ver com os dois.
Isabela Bosi – Fazer um filtro das canções dele.
Júlia Shimura – Exatamente, foi uma coisa da gente realmente se interessar pelo conceito.
Pedrinhu Junqueira – Foi quando seu pai faleceu também [de Júlia], nesse exato momento. A gente fez uma peça em junho de 2014, seu pai morreu em outubro, e aí quando acabou a peça, a gente decidiu fazer o disco. Pesquisamos sobre e descobrimos o haiku, que era com “k”, e aí “abrasileiramos” o Haicu.
Júlia Shimura – Quando a gente foi selecionar o repertório, a gente foi pra dentro dos conceitos da filosofia “zen”, a contemplação da natureza, uma coisa menos eu e mais uma fotografia de uma estante, a efemeridade do tempo e da morte. Não fomos com um rigor de métrica, até porque não tinham essa proposta de serem haicus. E uma das músicas é um haicu do Matsuo Bashô [poeta japonês, 1644-1694], um dos grandes dessa poesia.
Isabela Bosi – Como vocês chegaram a essa escolha do Matsuo Bashô?
Júlia Shimura – Algumas canções surgiram, quando você está em processo de trabalho, você não pensa “ah, eu vou fazer uma música agora”, às vezes você tá fazendo outra coisa, e aí você pensa que tem tudo a ver, e encaixa ali e vai lapidando, pra caber no conceito, e o haicu do Matsuo Bashô foi uma coisa que eu realmente parei e pensei: vamos botar um haicu de verdade, um clássico. E parei pra pensar mesmo e escolhi esse pelo significado e pela sonoridade e, claro, pelo contexto da minha vida. Nós vamos escutar, mas a primeira parte é o haicu original e a segunda parte é uma tradução livre que eu fiz.
Rafael Julião – Você fala japonês fluente?
Júlia Shimura – Não, eu já estudei um pouco, eu entendo a estrutura da língua, estudei um pouco quando criança e até depois quando entrei na faculdade.
Pedrinhu Junqueira – A avó dela é japonesa.
Júlia Shimura – Eu sou meio japonesa, meu pai nasceu aqui no Brasil, mas meus avós vieram do Japão adolescentes e, por parte de mãe, é brasileiro normal, sou vira-lata.
Isabela Bosi – Você fez uma tradução livre sem se preocupar muito?
Júlia Shimura – Não, aí eu parei pra estudar, por exemplo, chichi haha no, chichi é papai, haha é mamãe e no é uma partícula que significa posse, então seria “meu pai e mãe”. A estrutura da língua é diferente, aí eu fui pesquisando as palavras e fui vendo que as traduções de haicu, elas tentam muito criar algo de conclusão, que às vezes não é isso, quando você vê no japonês é algo mais simples, direto. Aí modifiquei coisas também, encontrei uma tradução que era assim: “como sinto falta de meus pais quando ouço a voz do faisão” e quando você vai ver é: “meu pai e minha mãe, sinto falta deles, escuto o faisão”, é algo assim, aí mudei o faisão por galo.
Pedrinhu Junqueira – Cada um escuta o pássaro que tem, né?!
Júlia Shimura – Cada um na sua semântica né, porque o haicu tem uma coisa de sempre ter uma palavra relativa a estação do ano, então pode ser um elemento da natureza, árvore, ou então um animal, mas o faisão é relativo ao verão, algo que, sei lá, não faz sentido.
Pedrinhu Junqueira – Quanto ao galo, eu achei muito bom ela ter mostrado essa tradução, “canta o galo”.
Rafael Julião – Uma ótima substituição.
Júlia Shimura – Mas aí eu fiz dentro da métrica.
Rafael Julião – Vamos ouvir as três próximas.
Isabela Bosi – É “Nada vai”, “Fall” e “Never Die”.
Rafael Julião – Vocês acabaram tocando no tema da morte. Interessante, que eu já tinha ouvido o disco algumas vezes, e fui ler as coisas depois e as coisas nunca batem, e a Júlia, em uma entrevista… Se quiser renegar a entrevista você avisa… (risos) Ela diz que o disco fala mais sobre a morte do que sobre o amor, ou melhor, “mais sobre a perda, a ruptura do que sobre o encontro”. Numa outra resenha do disco tinha assim: “o resumo do disco são: vozes delicadas, arranjos contidos e versos marcados em essência pela angústia”. E eu terminei o disco, todas as minhas primeiras audições, com uma sensação tão grande de leveza, de delicadeza, até porque há humor, há coloquialidade, essa “Never Die” parece mesmo uma canção de ninar adultos.
Pedrinhu Junqueira – Quando eu fiz, era uma ideia de ninar morte.
Rafael Julião – Ela (Júlia) falou isso numa entrevista, a parte do “ninar” ela já havia colocado, tô dando crédito aqui. Mas o adulto é porquê o Drummond tem um poema, “Canção amiga”, que fala alguma coisa como “Eu preparo uma canção/ que faça acordar os homens/ e adormecer as crianças”, e me veio esse verso, e essa sensação de uma canção pra ninar os adultos. Aí eu fiquei com isso na cabeça, um fala “versos marcados pela angústia”, você fala na coisa da morte e eu só conseguia pensar em leveza, em delicadeza, em coloquialidade. Então suponho que estejamos certos os dois né? É isso? Como vocês veem essa tematização da morte contrabalançada?
Júlia Shimura e Pedrinhu Junqueira – Eu acho que tá tudo certo.
Júlia Shimura – Engraçado que você falou isso, porque eu estava justamente pensando nessa frase que falei na pergunta que a jornalista tinha feito, que era: o disco era sobre o amor que não dói.
Pedrinhu Junqueira – A vontade que eu tive era de perguntar se ela realmente tinha escutado o disco.
Júlia Shimura – Mas acho que talvez nesse lugar de leveza, ela tenha encontrado isso.
Isabela Bosi – As melodias são leves né, e tem a coisa da voz de vocês, que é muito suave, e acho que isso é uma forma de contrabalançar esse tema que é tão pesado. Foi pensado?
Pedrinhu Junqueira – Não, não foi nada pensado nesse sentido, a questão da morte, desse existencialismo, é uma coisa que sempre uniu eu e a Júlia, de conversas da nossa vida, ela perdeu o pai e a mãe, coisas da vida mesmo e eu dou valor a isso, memória, antepassados. Quando começamos a estudar a ideia do disco e os haicais, eu acho que isso já era uma coisa muito presente nas minhas músicas e nas dela, e tem a ver, porque o haicai tem essa coisa de contemplação e de como o tempo passa e nada mais exemplifica isso do que a morte, o tempo passar, essa erosão do tempo, da pele, a velhice, as pessoas que vão morrendo, você vai ficando mais velho e as pessoas vão morrendo mesmo, é uma coisa que acontece. As melodias serem mais leves foram um acaso, não foi nem um pouco pensado, naturalmente com nossas composições, não tivemos essa dimensão na hora de fazer o disco.
Rafael Julião – Mas talvez isso esteja grudado no olhar de vocês sobre a morte mesmo.
Júlia Shimura – Sim, acho que isso está dentro do conceito de forma inconsciente, essa tentativa zen, porque a morte é um turbilhão realmente, como respirar no meio disso, cantar é respirar, né, botar pra fora, como que você atravessa isso de alguma forma, porque óbvio que temos canções com outras caras, acho que a criação sai mais fácil e mais espontânea, quando você tá na merda, quando precisa ressignificar a coisa. Eu acabo pelo menos pensando quando estou compondo se eu realmente quero colocar essa frase, vou repetir pra caralho isso. Esse lugar de ser uma oração, um mantra, que tem tudo haver com o haicu, o passar do tempo e a repetição do dia-a-dia, o cotidiano, tem o fato de sermos um casal, e como olhamos pro cotidiano e extraímos a epifania. A gente associa a morte a esse lugar.
Pedrinhu Junqueira – Acho engraçado isso, porque eu particularmente não tenho a menor leveza de olhar pra morte mesmo. Na verdade, é algo que me angustia bastante. Eu sempre fico pensando, a vida como você falou é um turbilhão, você aprende pra caralho, vive pra caralho, particularmente eu não tenho uma crença de que vai existir uma continuidade e isso me angustia muito. O que é meio pesado, porque você vive tanta coisa, tantas memórias, e as músicas. A segunda música do álbum “Nada vai” eu fiz realmente em prantos, perdi uma pessoa muito especial e aquela música surgiu em três minutos, um vômito mesmo, e outras do disco que tem esse tema.
Júlia Shimura – A primeira você fez pra sua avó.
Pedrinhu Junqueira – Não é que eu fiz pra minha avó; eu estava em um momento que a minha avó tinha morrido, e a minha avó era muito religiosa, e aí, um dia, eu não lembro como foi a situação, me lembrei dela no ônibus, e acabei assoviando aquela melodia e fiz a música em segundos, tentando refletir sobre a morte da minha avó. Essas pessoas muito católicas tem essa coisa da iluminação.
Isabela Bosi – Como foi essa forma de lidar com essa angústia?
Pedrinhu Junqueira – Eu tava tentando entender o lado dela, de como uma pessoa tão religiosa morre. Porque eu percebo que as pessoas mais religiosas, elas têm uma leveza com a morte. Uma pessoa que se apega muito à religião, ela tende a viver um pouco mais, porque a religião serve pra isso. Uma segurança, as pessoas se apegam a isso. Eu lembro que a minha avó com noventa e poucos anos, ela muito tranquila. Acho que não teve um contraponto, foi algo que surgiu espontaneamente de uma visão nossa sobre as melodias. Eu não consigo escutar o disco de fora, acho angustiante não ter essa visão do espectador, isenta, não consigo ter, sempre lembro de coisas e me crítico.
Isabela Bosi – É difícil julgar (o disco)?
Pedrinhu Junqueira – É muito difícil, porque é como se eu tivesse um bloqueio, uma parede, eu não consigo estar isento, como se ouvisse uma outra música.
Júlia Shimura – Mas a gente já escutou muito, então eu acho que é mais tranquilo. Porque as primeiras vezes eu ficava “ai, meu Deus “.
Pedrinhu Junqueira – No início a gente tinha mais dificuldade, mas é difícil, não é fácil se escutar, justamente por não ter esse olhar de espectador que eu queria ter. A gente participou de cada camada, os versos, o violão.
Isabela Bosi – Isso que eu ia perguntar, essa parte da produção, porque você já tinha essas composições, a maioria, e vocês já chegaram no estúdio com os arranjos prontos, ou foi algo que construíram juntos com outros músicos? E como foi a escolha desses músicos, você falou do Pedro Dantas no baixo, o Thomas Harres que fez a produção em volta do disco, como foi esse processo de produção e gravação dentro do estúdio?
Pedrinhu Junqueira – Foi muito natural, não levamos nenhum arranjo pronto, levamos as canções brutas no violão, e passamos lá dentro, temos muitos amigos músicos, então temos mais facilidade. É muito difícil fazer um disco, é caro, estúdio, microfone, é muita coisa. Foi de uma forma muito tranquila, as coisas que eu mais gosto de lembrar quando escuto o disco é dos dias de estúdio com a galera, é o que eu quero pro próximo disco, é estar ainda mais dentro disso. Daqui a uns anos já quero estar “cascudo” de entrar no estúdio e gravar o disco. Porque tem esse lugar de, como nas composições, escolher uma palavra, uma harmonia, mas quando sai do violão e vai pro estúdio também tem esse outro lugar de muitas opções e caminhos.
Júlia Shimura – E foi feito muito coletivamente, tantos os músicos como o Martin Scian que mixou todos tiveram muita liberdade pra se colocar, esse foi o caminho do primeiro disco, primeiro que a gente faz, talvez o próximo a gente pare pra pensar mais nos arranjos.
Isabela Bosi – Mas os arranjos foram pensados nesse momento da gravação, juntos?
Pedrinhu Junqueira – Foram.
Júlia Shimura – Thomas Harres de alguma maneira encabeçou um pouco, mas quando fomos pro estúdio foram Thomas Harres, Mauricio Calmon.
Pedrinhu Junqueira – Fizemos uma prévia mesmo, para escolher o repertório com o Thomas, e ele ajudou a fechar. No início eram 15 músicas e depois, no processo da mixagem, nós tiramos duas, achei que 13 ia ficar um número que eu gosto, é o momento certo, tiramos duas que estão lá de bônus, um dia a gente vai lançar.
Isabela Bosi – Vocês gravaram?
Pedrinhu Junqueira – Elas ficaram prontas, mas foi uma questão estética, a gente não achou que elas estavam iguais às outras, uma era uma versão eletrônica da “Amor”, e “Fudeu”, são as únicas músicas que fizemos realmente juntos. Mas foi um processo bem legal, foi coletivo mesmo. Não consigo ser esse cara que já chega com tudo pronto e doa pras pessoas, não consigo mesmo, eu gosto muito das pessoas agregarem, gosto de trabalhar assim, funciono bem desse jeito.
Isabela Bosi – E a escolha desse time, dos músicos.
Júlia Shimura – Foram os amigos, ainda bem que possuímos esses amigos que são músicos incríveis.
Pedrinhu Junqueira – A gente tinha feito uma peça com o Thomas, né?
Júlia Shimura – Eu me lembro que o Thomas Harres tava produzindo, na época, um cara chamado Zola Star, um cara meio congolês, meio angolano, e ele tava gravando o disco dele e queria gravar uns “backings”. Nessa de ver ele produzindo o disco, a gente falou: “É o Thomas, vamos chamar o Thomas”.
Pedrinhu Junqueira – E aí chegamos a produzir o disco, e chegamos nesses músicos.
Júlia Shimura – Pedro Dantas é muito amigo do Pedrinhu, além de ser um baixista foda. Mauricio Calmon também, ele que cedeu o estúdio pra gente. Tem participações também, Gabriel Ballesté que é outro irmão nosso, Antônio Neves. Foi realmente algo de parceria, amor e amizade. Graças a Deus são pessoas que são artistas fodas.
Pedrinhu Junqueira – Eu não acredito muito em sorte. Mas eu olho pra minha vida, o que aconteceu, essas pessoas, a gente estar aqui. As coisas vão indo de uma forma despretensiosa, fiquei muito amigo de uma galera, que hoje são músicos incríveis e é só ligar que eles gravam sem nem pensar, isso é uma benção na minha vida, que eu agradeço sempre, que incrível contar com pessoas que eu sou completamente apaixonado e fã. Sou completamente fã do Pedro, do Thomas, do Maurício, Antônio Neves, do Gabriel, de toda essa galera. Tem o Cláudio Andrade, que é um grande tecladista. O Leandro Joaquim nem chegou a gravar na verdade, não teve trompete no final.
Isabela Bosi – Então não era pra ele estar na ficha técnica?
Pedrinhu Junqueira – Nossa. É porque ia ter essa gravação, deve ter passado na ficha técnica. A Nana Carneiro, ia rolar a gravação com a galera do metal, até que a gente decidiu fechar o disco sem a galera do metal mesmo.
Isabela Bosi – Foi rápido pensar isso no estúdio ?
Pedrinhu Junqueira – No estúdio, foram três dias pra gravar as bases e depois tiveram alguns dias pra gravar guitarra, gravar vozes. O processo inteiro foi um pouco longo, porque estávamos fazendo sem dinheiro, dependia do estúdio do nosso amigo estar livre, mil coisas, da agenda da galera. O processo inteiro levou um ano, desde a primeira gravação até o lançamento.
Isabela Bosi – Foi mixado no mesmo estúdio também?
Pedrinhu Junqueira – Não, a mixagem foi com o Martin, conhecemos pela Ava Rocha, pelo Thomas. Ele escutou o disco e falou que se interessou, chegamos em um acordo e ele fez a mixagem e a masterização.
Rafael Julião – Com meu coração tropicalista, eu queria chamar atenção para outra coisa, desse bloco, especificamente das canções, começa com “Nada Vai”. Quer dizer, eu estou ouvindo um disco que está vinculado a uma cultura japonesa, com uma descendente de japonesa, e é uma música que fala de carnaval, que é uma coisa da da cultura brasileira, e eu fiquei pensando no carnaval como uma coisa de excessos e festas e, ao mesmo tempo, a cultura oriental que é muito associada com a concisão, com a contemplação, com a calma, e logo depois entram duas músicas que misturam o português e o inglês. Então, eu queria que vocês comentassem essa globalização que acontece nessas primeiras partes do disco, em que essa brasilidade se encontra com essa coisa japonesa, o que há de japonês nesse disco, para além do título, e como é essa entrada do inglês no meio dessa conversa.
Pedrinhu Junqueira – Eu, como você, considero que somos filhos do tropicalismo, talvez seja o expoente que mais gosto na música brasileira. Mas não foi algo pensado. O inglês foi algo que tivemos mais dificuldade, até percebi que agora são duas seguidas.
Júlia Shimura – Mas não incomoda, depois de escolhido você pensa “caramba tem várias coisas em inglês”. Mas é natural, acho que aquilo tá no seu DNA, faz parte da sua formação, naturalmente você compõe. Eu pelo menos componho em inglês e misturo com português sem a menor cerimônia. Eu acho que foi até o Bruno Cosentino que sugeriu colocar a última frase do “Fall” em português, posso estar enganada, mas me lembro de você ter sugerido.
Pedrinhu Junqueira – Pra gente fazer misturado.
Júlia Shimura – Mas quando eu compus, eu só tinha feito só em inglês. Aí o Bruno sugeriu: “podia colocar essa frase também em português”. Aí eu disse: “é, essa frase vai em português” e é muito melhor realmente.
Pedrinhu Junqueira – Eu acho que o inglês é, pro bem e pro mal, uma língua que está aqui. O Brasil ainda é um país extremamente influenciado pelas Américas, Estados Unidos, e desde pequeno você tá ligado no inglês.
Júlia Shimura – E musicalmente é o que a gente escuta também. Escutamos música brasileira, música inglesa e música americana.
Pedrinhu Junqueira – Sim, a música americana é maravilhosa, eu acho eles os melhores que tem, eles são incríveis mesmo. Naturalmente, desde pequeno você canta em inglês.
Rafael Julião – Vocês escutam música japonesa?
Júlia Shimura – Não.
Rafael Julião – Você não sabe cantarolar nada?
Júlia Shimura – Eu sei música de criança, tipo da tartaruga e tudo mais.
Rafael Julião – Isso não entrou no álbum?
Pedrinhu Junqueira – O Haicu nós tentamos abordar por um campo muito mais poético e de uma adaptação nossa, do Haicu que a gente conseguiu. Nenhum momento tivemos uma pretensão, e até nos questionamos no início “poxa será que a gente vai tentar uns instrumentos orientais”, mas nos estudos a gente desencanou disso. “Não vamos tentar, não tem porque a gente ir atrás disso, porque não vai ser natural”. Acho que o natural é o que está aí, de sonoridade. Mas também nos preocupamos em pensar isso.
Júlia Shimura – O Thomas também veio com a coisa de “vamos botar os tambores”, aquilo ecoando na sala, tem a “Nem vem” que tem uma atmosfera assim. Mas a gente nunca, de fato, escutou música japonesa.
Isabela Bosi – Seria forçado pra vocês ?
Pedrinhu Junqueira – Seria. Mas tem uma cantada em japonês, no início, que eu ficava meio assim “cara, será?”. Mas no final a gente super falou “é isso”.
Júlia Shimura – É, o Pedrinhu encrencou muito com o nome no início, porque a gente ficava “qual vai ser o nome?” Escolher nome é muito difícil.
Pedrinhu Junqueira – Eu não queria o nome Haicu, meio que fui convencido.
Isabela Bosi – Pra canção?
Pedrinhu Junqueira – Não, pra dupla, pro duo.
Isabela Bosi – E esse nome é um nome que ficou?
Pedrinhu Junqueira – Ficou, eu tive muita dificuldade justamente por isso.
Júlia Shimura – Será que não vai ficar muito associado.
Pedrinhu Junqueira – Será que a gente não vai ficar restrito? Mas, depois, quando você começa a ver nome de banda, você começa a ver que nome, na verdade, é uma obrigação comercial. Você não pode ter uma banda que não tem nome, não existe isso. Por isso que aceitei o nome, mas tive dificuldade, sim.
Júlia Shimura – Era “Pedrinhu e Júlia”, aí eu falei “não”, primeiro que Júlia tá depois, e em tempos de feminismo e ainda sou japonesa. Porque tem toda essa tradição de andar atrás do marido, acho que é até uma das coisas que, dentro da minha formação, acabou de alguma maneira me afastando, mas eu sempre tive essa coisa de sempre me afirmar. E toda essa cultura japonesa de ser a menina que fala baixo e é comportada, e eu acho que eu sempre busquei, porque as pessoas te julgam pela sua cara, e sei lá, eu era uma boa aluna e sempre falavam “ela é nerd” e eu fazia questão de falar “não, não estudo nada”, carioquíssima sabe. Então, acho que tem esse lugar de eu ir me moldando pra um lugar mais distante. A minha irmã é bem mais “japonesa” do que eu, inclusive se interessa muito mais pelas coisas da cultura pop japonesa e mangá, ela desenvolve videogame.
Pedrinhu Junqueira – É a tua irmã é um Pikachu mesmo.
Júlia Shimura – Ela é toda fofinha mesmo, não fala palavrão, maravilhosa, e eu falo “nossa igualzinha a mim, puta que pariu”.
Pedrinhu Junqueira – A Júlia se incomodava, e eu respeito isso, no início que era “Pedrinhu e Júlia” e ela falava “não, não tá certo”.
Júlia Shimura – Se fosse “Júlia e Pedrinhu” iam achar que era dupla sertaneja.
Pedrinhu Junqueira – Eu até falei que, se te incomoda isso, sem o menor problema, vamos ser “Júlia e Pedrinhu”.
Júlia Shimura – Não, vamos achar algo mais interessante né? Aí, o Haicu pra mim, de certa forma, foi um resgate de olhar também para a cultura japonesa e construir também o meu lugar dentro disso.
Rafael Julião – É um signo que vocês estão construindo. Muitas perguntas que eu fiz parece que essas coisas vão chegando e vão preenchendo esse sentido.
Pedrinhu Junqueira – Sim, na verdade, eu inclusive gosto muito dessa forma, gosto de fazer primeiro e pensar depois, realmente não tenho essa facilidade de “vamos pensar algo aqui, vamos fazer metódico” não, pra mim é tudo improviso: “vamos fazer e depois a gente extrai daqui o que der”.
Rafael Julião – Vocês já perceberam, depois de feito, coisas que estão ditas ali que não sabiam que estavam? Por exemplo, agora vocês falaram da sequência das músicas em inglês. Fiquei pensando no carnaval, porque, pra mim, “Nada vai” era um lance de separação, e aí você fala em morte, e agora eu penso no carnaval, mas na “quarta feira de cinzas”. Com essas tantas escutas, já descobriram coisas no disco que vocês já tinham pensado e acham relevante contar?
Isabela Bosi – Justamente por ser feito de uma forma muito intuitiva, as coisas vão acontecendo e vocês depois se dão conta de o que aconteceu no processo.
Rafael Julião – Vocês lembram algo que descobriram depois que ouviram ou alguém apontou e vocês pensaram que fizeram sem querer?
Pedrinhu Junqueira – Eu não sei se saberia agora algo em específico.
Júlia Shimura – Uma das características do Haicu é você lançar um fragmento, e você completou de várias formas que tem a ver com a sua vivência, com o que você ouviu. Essa é uma das características que é interessante, principalmente nesses tempos de hiper-informação, que tudo é verborrágico. Como que as pessoas completam o sentido da forma delas, sinto mais essa surpresa de você ter descrito um cenário. O Haicu é uma imagem, ele se lança como uma imagem e cada um forma a sua.
Rafael Julião – Vamos escutar mais três, então? Que são?
Isabela Bosi – “Amor”, “Nem Vem” e “Fudeu”.
Pedrinhu Junqueira – Lembrando agora que alguém me falou que “Fudeu” tem uma sonoridade oriental, e eu nunca tinha percebido isso.
Júlia Shimura – Fuder é pincel em japonês.
Rafael Julião – Bom, eu anotei aqui para perguntar. O “Amor”, como eu disse, é uma das minhas músicas preferidas, e ela me remete, não sei se foi proposital, mas me remete especificamente aos “Secos e Molhados”, no efeito que vocês fazem no final, me remete a “Primavera nos dentes”.
Pedrinhu Junqueira – Olha, que massa.
Rafael Julião – Já tenho a resposta né? Não foi proposital. Inclusive, o “Secos e Molhados” tem uma música chamada “Amor” que fala em leveza. Eu queria saber se houve alguma referência proposital a alguém, ou alguma outra canção ou gênero que influenciou majoritariamente o disco. Alguma referência consciente, algum músico que, de repente, vocês estavam ouvindo e que influenciou esse período de construção desse trabalho.
Pedrinhu Junqueira – Tem, não diretamente, mas tem uma música que eu fiz que é “O Fogo vai subir” que eu fiz depois de assistir ao show de um amigo meu, do Negro Leo, ele até veio a gravar a música depois, e aí foi uma referência pra mim. Que acabou entrando também no “Nada vai”, porque eu também toco muito com o Leo e aprendo muito com ele, e ele sempre tá muito ligado nessas músicas circulares. O “Nada vai” tem muito isso, dos mesmos acordes e vai indo. Pra mim, o Negro Leo é uma grande referência direta nas coisas que faço, um dos artistas que mais admiro, não sei se pra Júlia tem isso também. O “Secos e Molhados” não foi pensado, achei incrível você falar isso.
Júlia Shimura – Referência direta eu não acho. Identifico que você escuta e “isso tem cara realmente disso”. Tropicalista, eu identifico as coisas que falo: “realmente isso aqui que a gente faz é totalmente influenciado”. Acho que tem uma cara de Mutantes também.
Pedrinhu Junqueira – A “Fall” acho que tem cara de “Mutantes”.
Júlia Shimura – Umas coisas que a gente não parou pra pensar. Depois a gente vê que realmente fomos influenciados por algo.
Isabela Bosi – Você falou do Negro Leo que ele gravou “o Fogo vai subir” e o Bruno Cosentino gravou “Amor” e toca “Nem vem”, e você falou que tem muitos amigos músicos e eles estão sempre aparecendo. Queria que vocês falassem como enxergam esse cenário musical de hoje, da geração de vocês, especialmente aqui no Rio de Janeiro.
Pedrinhu Junqueira – Eu acho que estamos em um dos melhores momentos, e ele está incrível aqui no Rio, não só aqui, mas a música independente está muito grande, tem muita coisa acontecendo. Por outro lado, a gente tá em um momento de transição da mídia, da internet que dificulta muito a viver de música.
Júlia Shimura – Por um lado democratizou, e isso também influencia no fato de podermos ouvir coisas que não ouvíamos antigamente. Mas ao mesmo tempo essa mudança de paradigma de como ganhar dinheiro com música também é foda mesmo. Coisa de cenário das casas de show, tem uma oferta enorme de músicos e artistas fodas, mas ao mesmo tempo não tem espaço. A cultura vive um momento complicadíssimo.
Pedrinhu Junqueira – A música “Fudeu” é justamente sobre isso, música apocalíptica que eu e Júlia estávamos fazendo sobre esse lugar que nos encontramos agora, as demandas. Nunca tantas espécies entraram em extinção, estamos em um momento de cataclisma, literalmente, não é poesia ou coisas distantes. É algo que está acontecendo mesmo. O fascismo está muito grande no mundo inteiro, a intolerância, isso leva pra uma contracultura. O tropicalismo mesmo nasceu de um momento bizarro no Brasil. Existem sempre essas dualidades. No nosso ponto de vista o Rio de Janeiro vive algo muito ruim, uma aristocracia musical muito grande, se você não tem sobrenome ou não conhece alguém do meio. Por exemplo, a gente não tem nenhum show marcado, esse segundo semestre foi horrível, fiquei muito deprê de falar “cara a vontade que eu tenho é de virar agricultor mesmo”, que eu amo também, ir pro mato e fazer música porque eu não sei fazer outra coisa. Mas dá uma certa angústia de falar “caralho, que bizarro o que eu tenho que fazer”, sabe? Quem eu tenho que ligar pra conseguir fazer show? Então é um momento muito difícil, e por isso eu acho que é muito ambíguo também. Porque ao mesmo tempo eu sinto que tem muita coisa legal acontecendo, poderia citar tranquilamente 20, 30 artistas fodas no eixo Rio, São Paulo, Recife, Belo Horizonte. É muita coisa que tá acontecendo sabe?
Isabela Bosi – E como é quando esses seus amigos ou outros artistas gravam uma música sua?
Pedrinhu Junqueira – Pra mim isso é a cereja do bolo, como compositor tem uma ressignificação muito grande quando alguém grava. O Bruno gravou o “Amor” e levou pra um lugar tão bonito no disco, uns arranjos incríveis com uma galera foda. Nesse momento eu sinto algo, de estar rolando, sabe? Posso não estar ganhando 1 centavo, mas de alguma maneira, tudo que eu vivi até hoje, 32 anos, tá rolando. Levou pra um lugar, Bruno Cosentino gravou, Negro Leo gravou duas, dei umas músicas pro Macalé. De alguma maneira as coisas estão acontecendo, estamos vivendo um momento incrível, vamos ter um filho, isso está ressignificando tudo, desde as composições até como eu vejo o mundo. Eu enxergo muitas coisas boas, mas também dá um certo desespero, mas essa parte é a melhor. Pra mim isso é realmente, como se o Gil gravasse, porque eu admiro o Negro Leo pra caralho.
Isabela Bosi – E o contrário? Vocês não pensaram em colocar canções de outras pessoas no disco? Ou trazer pessoas para cantarem no disco?
Pedrinhu Junqueira – A gente pensou, mas não levamos pra frente, nesse primeiro disco, resolvemos não fazer isso, resolvemos fazer um disco inteiro nosso, é o primeiro, mas eu tenho grandes ideias para o próximo disco ser bem mais abrangente no sentido de gravar músicas de amigos, chamar gente pra cantar. Foi algo do primeiro disco, de vamos resolver aqui mesmo.
Júlia Shimura – Acho que tem um lugar de identidade também. Eu virei cantora agora, mas poderia até ser uma atriz que cantava, acho que o lugar da música também era o da criação, foi natural a gente se colocar como compositor no disco, eu sinto isso. Aquela coisa, tem muita música, o que vamos escolher, acho que nem pensamos muito nisso, sabe, como a gente faz um recorte dentro da gente. Pra cantar a gente até pensou, mas dentro da produção não. Até tem vozes de amigos e tal.
Pedrinhu Junqueira – Na “Never Die” tem um coro que a Nana fez pra gente.
Rafael Julião – E agora de modo mais objetivo, o clipe de “Nem vem” foi selecionado pro festival de curtas de Brasília, a gente estava falando de cinema, coincidentemente agora pouco, parece uma boa oportunidade de comentar sobre.
Pedrinhu Junqueira – Isso foi outra coisa incrível que a gente não esperava nem um pouco.
Júlia Shimura – Uma coisa que temos muita dificuldade é vender a coisa. O clipe a gente falou “ah não, vamos fazer um clipe porque é muito legal”, se estamos lançando uma banda, um disco, temos que fazer um clipe. Fizemos várias reuniões com um amigo cineasta, que aí vem várias ideias, e pouca grana que a gente tem, aí foi indo, chamamos outro amigo também não rolou, aí teve uma hora que falamos: cara, vamos fazer eu e você, Pedrinhu, ele é formado em montagem pela Darcy Ribeiro. Eu sou atriz, estudei cinema, estudei roteiro, já tive produtora, então a gente tem essa relação com o áudio visual, e aí a gente falou, vamos fazer a gente, na raça, e aí fizemos tudo com GoPro.
Pedrinhu Junqueira – Pra mim foi meu reencontro total com a montagem, eu trabalhei 22 anos com montagem, com edição. Depois entrei no teatro e depois saí, porque fiz vários trabalhos chatos com edição. E esse clipe foi o reencontro, primeiro que rolou essas dificuldades de produção. Pegamos a GoPro, filmamos e editamos.
Júlia Shimura – E na intuição, não roterizamos nem nada. Tipo “ah, tive uma ideia, você pega o guaraná natural, aí você vai cuspir e depois a gente faz um reverse”. Eu não conhecia o trabalho do Pedrinhu como montador.
Pedrinhu Junqueira – Nem eu. Porque eu tinha trabalhado com outras coisas. Eu fiz Darcy, estudei muito cinema, naquela época eu fiz um trabalho muito maneiro, trabalhei seis meses no “tá na rua” digitalizando o material deles. Foi um trabalho incrível, já ligado ao teatro. Depois fiz uns trabalhos super chatos de teste de elenco, muito insuportável. Fiquei traumatizado, aí agora foi um reencontro mesmo.
Isabela Bosi – Pensando nessa parte da questão de imagem, a capa do disco, foram vocês mesmos que pensaram, tem algum designer, ou vocês mesmos que fizeram?
Júlia Shimura – Não, a parte gráfica foi a Chica Caldas e a Fernanda Guizan.
Pedrinhu Junqueira – Com as fotos da Elo Durand.
Júlia Shimura – Essa parte mesmo, nós não influenciamos tanto na criação. Óbvio que trazendo o conceito e tals, mas ficou mais nas mãos das meninas, e ficamos super felizes.
Pedrinhu Junqueira – A gente teve uma galera incrível que chegou junto. Foi uma das partes mais gostosas mesmo, das parcerias, como a galera chega junto, como você vai conhecendo gente, como que essa dialética vai funcionando, essa coisa da indicação do clipe, a gente começou a gargalhar, porque eu falei “que isso, cara!”. Porque a gente fez de uma maneira tão despretensiosa, já tínhamos chegado em um lugar que a gente ficou muito feliz, fizemos o clipe e ficamos muito felizes mesmo. Chegamos no lugar que a gente gostou, e isso já era o suficiente. Mas ainda rolou esse adendo, que foi maravilhoso, deu uma certa esperança.
Júlia Shimura – É interessante também o fato da gente ter feito o clipe, porque é uma característica do haicai, que se faça umas pinturas, que se chama haiga, é algo muito tradicional, então de certa maneira é o nosso haiga.
Isabela Bosi – Então vamos ouvir mais três : “Noite”, “Haicu” e “O fogo vai subir”.
Rafael Julião – Eu lendo as coisas, a Júlia classifica o álbum como mais Yin, então queria que você traduzisse porquê que o álbum é Yin.
Júlia Shimura – Eu acho que tem essa coisa feminina de estar gestando, essa morte, não é um lugar de ação, e sim de receber aquilo. Nesse sentido ele é Yin, ele fala, não em todas as músicas, mas de uma maneira geral, no momento que você tem que receber e ser passivo de alguma forma, não é o momento de agir, mas de entender o que o universo vai te dando. Entender a passagem do tempo, as transições, e a morte como uma metáfora de você sempre estar se transformando, a situação é diferente a cada dia, e como você vai lidando com as pequenas e grandes transformações. A morte sendo o símbolo mais radical.
Rafael Julião – E pra fazer a complementaridade entre o Yin e Yang. Ele (Pedrinhu) repetiu algumas vezes que é cético, não acredita na sorte, e você disse que é escorpiana, com ascendente em aquário, lua em câncer. Eu queria saber sobre essa cultura oriental, que abre uma janela sobre vários misticismos. Embora o Pedrinhu se diga cético, eu encontro um U no Pedrinhu que ele falou que gosta do 13, pro fim da música, aí eu pensei “é cético, mas gosta de número”. Então, esse misticismos atravessam vocês e o processo de vocês de alguma forma? Qual é o seu signo, Pedrinhu ?
Pedrinhu Junqueira – O meu signo já é uma doidera louca, porque eu sou ex-leão, eu fui leonino a vida inteira, quando eu tinha uns 28, a gente fez uma terapia, com uma amigona nossa, aí ela falou “não, você é virginiano”. Aí eu falei “que isso cara, eu nasci em 22 de agosto” só que como eu estou no limiar entre o 22 e 23, eu achei que era leão, sempre me viam como leonino, porque quando eu descobri o arquétipo do Virgem, comecei a me ver de outra maneira e compreendi que não era tão leonino assim, eles chamam de cúspide, quando você está entre esse limiar.
Júlia Shimura – Pela hora que nasceu é virginiano, mas ainda tá próximo do Leão, então tem características do Leão também.
Pedrinhu Junqueira – Você bombardeia a coisa durante anos, as pessoas têm uma dificuldade de te enxergar de outra maneira. Óbvio que aí também o meu ascendente é Touro e minha lua é Câncer. Eu e Júlia somos bem caseiros. Quando eu falei do cético, é porque eu tenho esse lugar da Terra, talvez por causa do meu ascendente, ou meus pais médicos, mas analisando friamente eu não me considero uma pessoa totalmente cética, sou apaixonado por física quântica, acho possível vida após a morte, eu não desconsidero, mas eu prefiro trabalhar com a ideia do cético. A eternidade me angustia pra caralho, isso me dá uma preguiça, imagina você ser eterno cara, que doidera.
Júlia Shimura – Eu acho que consigo ter mais tranquilidade que o Pedrinhu, em relação a morrer. Eu acho que eu sou mística, tenho simpatia por algumas coisas, não é que eu ache que astrologia é a realidade última; eu acho que é uma maneira de se entender, um ponto de vista, que a partir dele você tenta promover mudanças, ou fica mais tranquilo com características suas. Mas acho que, vindos do teatro, faz com que tenhamos esse lugar do mistério, do ritual, impalpável. Temos uma experiência com o Lucas, que era um cara do Oficina, e a gente fez uma peça do texto “Heliogábalo”, que era um imperador romano, o primeiro transsexual da história, e o autor da peça, Artaud, escreveu esse livro histórico, e o teatro dele é a Oficina. Então tivemos essa experiência de fazer um teatro ritualístico, e qualquer teatro passa por esse lugar. Até fazendo música e show, é até difícil, não tem essa preparação de deixar a coisa fluir, sentir essa energia, é só chega lá e faz. Mas não somos religiosos, temos curiosidades por várias coisas, mitologia africana, oriental de outro lado, nos interessamos. Minha monografia na faculdade de publicidade foi sobre sagrado.
Pedrinhu Junqueira – Eu me interesso muito, não deixo nada no campo do impossível. Acho que a gente não sabe porra nenhuma e eu gosto de trabalhar com essa ideia. Isso do teatro que a Júlia falou, é verdade. Eu vejo muito o antes e depois, porque quando comecei a trabalhar com o teatro eu tive um entendimento muito maior do mundo e de mim. Até porque eu fui criado em família religiosa, então até os 14 anos eu tinha que ir à missa, uma parada que eu odiava. Tenho asco por igreja católica, mas foi um lugar que me levou a música, porque a galera cantava muito, minha mãe canta bem, é afinada. Mas não posso negar isso. Quem trabalha com teatro e música, não pode dizer que é cético, porque já vimos coisas bizarras no teatro. Eu acredito em coisas sobrenaturais, energias e subtextos, acho que o mundo como ele é, como se tivessem calcando a sua glândula pineal. A ideia do mundo hoje é pra ser criado nessa maquininha. A gente foi morar em Maricá, foi esse momento de mexer na terra, andar descalço, porque a Urca tá totalmente falida.
Isabela Bosi – Pensando nas ideias dos haicais, vocês trazem o do Bashô. Mas tem vários haicaistas brasileiros, e vocês não pensaram em trazer um haicai de um poeta brasileiro que vocês gostam?
Júlia Shimura – O Leminski é incrível, mas a gente pensa: um, direitos autorais, questões práticas. Eu tenho vários poemas da Cecília Meireles musicados, e o Pedrinhu falou: “por que Júlia? Você não vai conseguir gravar”.
Pedrinhu Junqueira – Eles fazem o jogo do policial mau e bom, tem um pessoal da família que fala que tá tudo ok e a outra fala que não. Na época a gente ficou tentando se munir, meu amigo deu um texto incrível sobre haicai, a gente quis ler coisas, não necessariamente musicar e estar ali, mas queríamos buscar em outros lugares para ter um entendimento do que íamos fazer. A gente leu bastante Leminski e Tarkovsky, e o Bashô.
Júlia Shimura – Haicai é um gênero muito popular no Brasil.
Isabela Bosi – Tem um livro só de Haicais, que tem tipo Drummond, vários poetas que não sabíamos que faziam haicais, é mais difundido do que imaginávamos.
Pedrinhu Junqueira – O Mariano disse que achou o disco totalmente cinematográfico, e eu achei essa leitura incrível. Os haicais tem esse lugar de paisagem, fixação e vazios.
Júlia Shimura – Eu lembro que o pai do Martin, que foi o que mixou, nos deu um livro de haicai do pai dele. Mas a gente não entrou na pira de fazer só haicais, a gente achou um conceito, tipo “espiral” que vai tocar agora.
Rafael Julião – Pediram e deram a deixa, porque agora é “Alzheimer” e “Espiral” e depois a gente faz o último bloco.
Rafael Julião – A minha pergunta é que o espiral parece que fecha o ciclo. Perguntamos sobre a escolha do repertório, e eu queria chamar a atenção pra ordenação, que começa com a luz que dissolve, e termina com essa espiral, quase fechando o ciclo e termina com o berro como um epílogo, e eu queria saber como foi esse processo da montagem.
Júlia Shimura – Foi muito difícil, até hoje a gente escuta e fica :”iiih, tem duas músicas em inglês, porque a gente fez isso.”
Pedrinhu Junqueira – Foi difícil, a parte mais difícil, até hoje eu escuto e acho que faria uma mudança, eu tiraria o “Nada vai” da segunda música, colocaria o “Alzheimer”. Foi difícil construir essa narrativa, chegar na ordem, uma hora a gente fala “é isso”, outra hora eu não fiquei muito satisfeito, não sei, que que você acha?
Júlia Shimura – De certa forma a gente tenta achar uma narrativa, e também buscar um comercial, quais são as primeiras, foi muito difícil, nós temos pouca propriedade pra falar sobre, porque não tivemos essa convicção da ordem. Por exemplo, o Thomas falou “o disco tá foda, mas a ordem podia ter sido melhor”.
Rafael Julião – Engraçado, eu acho lindo começar o disco com “Leve” e quase terminar com “Espiral”, que quase que retoma todos os movimentos do disco, de lembrar, esquecer, amar, desamar, viver, morrer. Parece que arredonda o desenho e depois tem o “Berro”, como um epílogo.
Pedrinhu Junqueira – Esse final foi isso que você falou, o “espiral” é uma música muito circular, eu lembro da gente falar dela ser a última mesmo, e o “Berro” entrou porque a música fala muito sobre violência, dessa dualidade do planeta, é maravilhoso viver aqui, mas tá bizarro, e aí ficou como epílogo mesmo. Mas foi muito difícil, acho que foi a parte mais difícil mesmo, é um quebra-cabeça e a construção de uma narrativa, nem todo mundo escuta na ordem, principalmente hoje em dia.
Rafael Julião – Mas a gente tá voltando pra uma história do disco, por conta da integridade narrativa do disco.
Pedrinhu Junqueira – É muito engraçado, porque tem o vinil, que é uma obra de arte, aí tem o CD. Porque quem gosta de música mesmo, uma obra, é o vinil, o vinil é um quadro mesmo. Quando eu vou no Thomas, você abre aquilo e vê dentro aquele mundo, a coisa física ali. A sociedade foi pra um lugar que se afastou dos rituais.
Isabela Bosi – Tem a ver com o tempo também, você parar pra ouvir demanda um tempo.
Júlia Shimura – E não consegue ter né, a ansiedade. Aí você lê artigo, escuta música, vê televisão.
Pedrinhu Junqueira – E essa crise da representatividade diz muito sobre isso, eu acho que a gente realmente se afastou de tudo, de ser animal, estar na Terra. Eu tenho preguiça de pensar que caralho, vou ter que pensar em um nome, vou ter que me vender, eu queria que a música fosse só música mesmo, que eu pudesse só tocar, e fazer jabá, ganhar dinheiro. Essa coisa do disco tá nesse lugar, as pessoas não tem mais tempo, não tem mais essa proximidade com a natureza, ritual. Tá tudo pronto, supermercado, televisão. O momento agora deve ser de retorno, porque não tem mais pra onde ir.
Isabela Bosi – Como é o show de vocês? A banda é essa que toca com vocês? Ou são só vocês dois?
Pedrinhu Junqueira – Quando dá pra fazer com banda a gente faz, quando não dá, a gente faz nós dois, trio já rolou, porque é foda trabalhar com banda grande, os caras são muito brother, já fizeram vários shows sem cobrar, mas não é o que eu quero pro meu amigo que vive disso, então procuro chamar eles quando a gente ganha um cachê maneiro.
Júlia Shimura – E é interessante também, porque criamos formatos diferentes, sonoridades diferentes.
Isabela Bosi – Vocês estão pensando no próximo disco?
Pedrinhu Junqueira – Estamos. Porque a gente não tá fazendo show, então tem música pra caralho, vontade também, então já pensamos no próximo disco e provavelmente vamos lançar em 2017, estamos compondo, pensando no repertório, vendo como vai ser. Uma coisa que o Negro Leo falou em São Paulo, no Thunderbird, e o Leo falou que quando você é da música independente, é incrível a quantidade de coisas que acontecem, mas quando você não tem uma assessoria de imprensa, não faz show, depois de um tempo a parada arrefece, e o Negro Leo tenta fazer isso, é uma tática dele, que eu acho foda, porque se você lança um disco de 6 em 6 meses você traz ouvintes. Porque essa é a parada, de trazer o foco, gente pra ouvir, de ficar em movimento, é algo que quero trazer, tem música rolando, muitos amigos que compõem, é só se organizar e estar lançando um disco sempre.
Rafael Julião – A gente queria agradecer muito a presença de vocês, a pergunta do João Gilberto a gente deixa pro epílogo, o mistério dele quando for o próximo disco. Foi muito agradável e eu amei ouvir de novo o disco de vocês. Conversando com vocês, o disco vai crescendo, e o trabalho de vocês é muito bonito.
Pedrinhu Junqueira – Queria agradecer a vocês e o aBruno. Achei incrível essa ideia, o primeiro foi com o Luís, e ser colocado numa bandeja com ele, quem eu admiro pra caralho, já é muito foda. Acho o projeto incrível, uma ideia muito pra frente, porque tem muita coisa rolando. Porque fora das rádios tem muita coisa rolando, é época da gente tentar, tem muita coisa rolando e criar esse diálogo e espaço.